sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Afinal, por que mentimos?




De acordo com o dicionário Howaiss, mentira significa “dizer, afirmar ser verdadeiro (aquilo que se sabe falso); dar informação falsa (a alguém) a fim de induzir ao erro, não corresponder a (aquilo que se espera); falhar, faltar, errar, causar ilusão a; dissimular a verdade; enganar, iludir, não revelar; esconder, ocultar”. Tais definições, no entanto, pouco dizem sobre os porquês da mentira. Por isso, vamos apresentar uma definição relacional (que leve em consideração o seu contexto).

As pessoas vivem 25% do próprio tempo mentindo. Esse é um consenso entre todos os que lidam de forma direta e indireta com o assunto. Na comunicação não verbal, ou seja, na linguagem das emoções, a mentira é percebível de forma mais simples do que na comunicação verbal. Quando utilizamos a comunicação verbal, a palavra, podemos mentir e omitir, dependendo de qual for o nosso interesse; em função da nossa habilidade, treino e sensibilidade, conseguimos atingir o nosso objetivo com uma certa facilidade. Na comunicação não verbal, a emoção, é possível identificar a mentira a partir da observação de um bom técnico em comportamento humano e em comunicação não verbal.

Quanto mais existe a necessidade de melhorar a imagem de si, ou de criá-la, mais as pessoas mentem
Difícil identificar um perfil específico do mentiroso, do mitomane puro, mas se procuramos nas várias transformações culturais ao longo das gerações passadas, encontramos desde a Eva que mentiu para Adão sobre ter comido a maçã, continuamos com mestre Geppetto e
Pinocchio, com o nariz que cresce, a Cuca que vai pegar... 

As pessoas mentem para se defender, mentem para se proteger, mentem para ter vantagens e serviços que nunca são conforme o prometido. A mentira tanto pode ser um meio como pode ser um fim para situações conflitantes. Ela deixa de ser ocasional, esporádica, para se tornar habitual e parte do contexto de vida das pessoas, provocando sofrimento e desgaste físico e emocional, além de gerar problemas jurídico-legais. O indivíduo mente desde a infância. Se tiver essa afinidade, mente para esconder um comportamento contrário à vontade dos pais ou da autoridade do momento, escola, padre da igreja, confissão, comunhão... Crescendo, mente para se sentir “up to date” com os amigos, sobre o desempenho sexual com o outro sexo, mente para passar a ideia de ser mais, de ter mais, de poder mais, porque assim acha que vai ser mais aceito e menos rejeitado. Dessa forma, seria um indivíduo que, pela própria carência, pela baixa autoestima, vive mais de aparência do que de realidade, perdendo pela transparência. 

Às vezes, para aquele jovem imaturo que quer recomeçar e assumir a sua fragilidade e retomar a viver uma realidade verdadeira, esse resgate é complicadíssimo, às vezes inviável, visto o emaranhado de sequelas, impressões e danos que a mentira, a mitomania gerou, e das quais não consegue mais se livrar, por ter perdido em algum lugar e em algum momento o “fio da Ariadne” que possa levá-lo a enfrentar o labirinto e vencer o Minotauro. 

A pessoa mente sem alguma necessidade, pelo simples prazer de achar, se iludir de ter tirado alguma vantagem ou benefício por meio da mentira: o maior cuidado é conseguir lembrar e não esquecer todas as mentiras e nuances delas para conseguir “manter o nível”.

E o mentiroso compulsivo?

Ele se aproxima mais da personalidade psicopata, quando no máximo do exagero da sua mentira: usa suas habilidades para tirar proveito, sua malícia. Não sente amor, vergonha, culpa, remorso. Busca somente o seu egoístico e solitário aproveitamento por meio de recompensas e gratificações imediatas. Com o passar do tempo e com o piorar do quadro patológico, o mentiroso compulsivo pode se transformar em um esquizofrênico paranoide, achando que é Napolão e/ou que é alguém que veio ao nosso mundo com a missão de nos salvar.

A personalidade do mentiroso, seja em qual idade for identificado, é de uma pessoa carente, frágil, com baixa autoestima, sempre ligado em querer agradar aos outros e ser aprovado por eles...

A teatralidade obrigatória para atender critérios de boa educação, cumprimentando pessoas que não interessam, acompanhando pessoas pelas quais vive um sentimento empático negativo, trazem aparentemente ganhos para o mentiroso e pela formação dele, rápida, superficial
e egoísta, mas, no final, o preço e o desgaste são imensos e a um custo elevadíssimo.

O caminho mais indicado hoje em dia é a TCC

Ou seja: a terapia cognitiva comportamental, porque ajuda o paciente a ter que se defrontar com a realidade dele, distorcida, versus uma realidade mais em sintonia com os fatos da sociedade na qual o indivíduo vive.
Conforme o peso da mentira, o indivíduo se incorpora a ela, acreditando ser e poder aquilo que a imaginação dele criou e permite alimentar, a ponto de tudo se tornar normal e natural. Não sendo descoberto e grudando cada vez mais no contexto, vai viver feliz, contente e realizado.

Grande responsabilidade é dos pais, que, desde a infância, dos filhos não conseguiram, não souberam, não quiseram definir e impor limites a eles para que crescessem dentro de limites e regras, não se tornando crianças inseguras, com baixa autoestima e, portanto, com enorme dificuldade de viver uma vida autônoma.

Dependente químico mente, querendo passar a ideia de estar abstinente, limpo, apesar das evidências contrárias. Precisamos estar atentos quando aparece um paciente, muito ágil, ligeiro, inteligente, que quer tirar vantagem.

Vendedores precisam mentir ou omitir para valorizar seu produto, assim como para sustentar situações e interesses criados por meio da mentira, e sempre haverá necessidade de mentir mais. Muitas vezes, o esforço maior é para sustentar essa mentira, e o quadro se tona como bola de neve, algo pequeno, mínimo, ao longo do tempo se torna algo enorme, complexo, do qual e muito difícil chegar à origem e à essência.

A cada ação corresponde uma reação igual e contrária: se a criança aprende que vai ser repreendida depois de fazer algo errado, vai aprender naturalmente a se proteger mentindo. Dessa forma, começa a desenvolver-se um adulto inseguro e mentiroso, que desde pequeno terá dificuldades de enfrentar as verdades e as realidades da vida, com as suas consequências.

Falsos elogios também podem ser considerados como mentira, desculpas exageradas e difíceis de serem acreditadas, assim como as “mentiras brancas”, ou seja, aquelas mentiras para justificar situações inocentes, como não querer atender alguém e mandar dizer que estamos ausentes etc.

Formas de ajudar os mentirosos a corrigir essa falha começam com exemplos, mostrando como é muito mais simples enfrentar uma verdade, por pior que possa ser, do que ter que conviver com o peso da mentira e com todas as consequências que isso acarreta.
Terapeuticamente, a TCC, terapia cognitiva comportamental, é a abordagem mais indicada, porque, por meio de exemplos e demonstrações, ajuda o paciente a aprender a enfrentar a sua realidade, reagir a ela e aprender a se assumir, melhorando a própria autoestima e vivendo a vida da forma mais simples e proveitosa possível.

A terapia que se utiliza da hipnose dinâmica também é muito eficaz, porque ajuda o paciente a entrar em contato com o próprio eu, com a própria essência, com o seu inconsciente e, através da própria imaginação, o paciente é estimulado a ver e refazer os processos da mentira, corrigindo-os, até conseguir criar uma visualização correta e gravar essa última versão como a definitiva no próprio registro mental.

Alguns comportamentos e atitudes da comunicação não verbal ajudam a identificar gestos e sinais peculiares de alguém que está mentindo:

- A pessoa que mente não olha direto nos olhos, desvia o olhar com frequência.

- Os olhos piscam com maior frequência do que normalmente.

- Os movimentos corporais, especialmente a cabeça, são projetados para trás.

- Os membros, tanto os superiores quanto os inferiores, ficam cruzados permanentemente, alternando a postura, o cruzamento.

- As mãos ficam tremulas e frias.

- A respiração se torna mais ofegante, com suspiros longos e intensos.

- Quando descoberto, o mentiroso perde a naturalidade e assume atitudes mais exageradas e exuberantes.

Leonard F. Verea é médico psiquiatra formado pela Faculdade de Medicina e Cirurgia de Milão, Itália. Especializado em Medicina Psicossomática e Hipnose Clínica; é membro de diversas entidades nacionais e internacionais. Contatos: verea@verea.com.br www.verea.com.br 

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Temos o Cérebro na Prisão




Porque a cada transgressão existencial nos sentimos perdidos e em conflito conosco? É nessa escolha de vida a causa dos nossos sofrimentos. Submissos como somos dos padrões e das normas que regulam a nossa sociedade, somos expostos as suas chantagens. Continuando a nos questionar sobre o que é bom ou ruim, arriscamos de viver sempre com o “ Livro das regras “ nas mãos.


Ao lado do senso de culpa convivem outros sentimentos que o definem e o completam. São emoções que tendem a bloquear qualquer fantasia que nos estimule a “soltar as amarras” e a viver plenamente. Os códigos da sociedade regulamentam a nossa vida: fazemos de tudo para que os outros nos aprovem, precisamos nos espelhar sempre em algum modelo de referencia e temos sempre a idea fixa de ficar melhor. Se a nossa vida é assim, temos os sensos de culpa sempre ativados e não temos alternativa.


Nietzsche mostra como isso tudo atinge o homem que busca a vida perfeita e sempre de acordo com todos, que ele define como o “o encantamento da sociedade e da paz”. O encantamento social que nos prende é um emaranhado de códigos, regras, proibições explicitas e não, chantagens emocionais...um mundo onde fazemos distinção entre o Certo e o Errado, onde buscamos os erros cometidos para depois nos culpar deles. Este é o resultado dos muitos modelos familiares, religiosos, culturais, que nos condicionam e que agem na nossa mente continuando nos dizendo o que é o Bem e o que é o Mal, se o nosso comportamento é aceitável ou não, se quem fica por perto aprovaria a nossa atitude ou não, dificultando ao nosso instinto sugerir como viver e ao nosso intuito de nos guiar como uma bússola entre os imprevistos da existência. O senso de culpa do ser humano é uma conseqüência da separação do nosso passado, da dificuldade em conviver com ele e de novas situações conflitantes que temos dificuldade em absorver.


Na realidade o nosso cérebro é curioso, criativo e faria um continuo “zapping”, assim como na TV, entre os diversos canais da vida: quando não gosta de algo, quando é repetido, mudaria para algo novo. Nos não, não nos sentimos preparados para pular existencialmente de um canal para o outro, acreditamos de ter que respeitar sempre a imagem que demos, sem nos distanciar desta idea. Talvez a temos construído com esforço e desgaste, suamos para fazer com que os outros nos aceitem e nos aprovem. É nesse momento que entra em jogo o senso de culpa para agir como um freio de mão: inibir qualquer iniciativa um pouco fora das regras, nos manter dentro das fileiras, fazendo com que as nossas ações sejam sempre dentro um nível conhecido e aceito e controlável.


Existe uma grande diferença entre uma poça e o mar aberto. A primeira é feita de água “morta”, sem surpresas. O segundo é um mundo em movimento, onde as ondas, o vento e as correntezas tornam muito vivo e imprevisível o fluxo da água. O senso de culpa tem a função de nos deixar longe do mar aberto, de não nos deixar nem conhece-lo, de estacionar em um espaço tranqüilo, onde não se machuca ninguém e se fica alí, junto com os outros. Mas é uma situação que mata a alma e a sua criatividade, que impede de amadurecer e descobrir as próprias potencialidades e autonomias para poder se separar do cardume.


Dr. Leonard F. Verea – médico psiquiatra formado pela Faculdade de Medicina e Cirurgia de Milão, Itália. Especializado em Medicina Psicossomática e Hipnose Dinâmica. Especialista em Medicina do Trabalho e Medicina do Tráfego. É membro de entidades nacionais e internacionais. Atua como diretor do Instituto Verea e da Unicap.
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Av. Lavandisca, 741- cj 108
 



sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Vencendo o medo de não conseguir




Muitas vezes, o medo de errar limita nossa capacidade e conseguimos menos do que esperamos. Esse medo de errar desaparece quando percebemos que a vida não é uma série de obrigações, mas um caminho de contínuas descobertas.

Todos os dias, erramos e acertamos, perdemos alguma oportunidade ou a aproveitamos. Alcançar objetivos é matar um leão por dia, e isso assusta muito.
“Precisamos perceber que não existe nada de definitivo ou para sempre, não existem fracassos permanentes.”
“Quando alguma atividade que desenvolvemos não dá certo, ao invés de ficarmos deprimidos, vamos continuar, sem ficar nos julgando permanentemente.”

Com essa atitude mental, o fracasso deixa de ser um obstáculo que compromete nossa autoestima e se torna um estímulo para melhorar cada vez mais a “pontaria” no alvo de nossos objetivos. Com aprendizado, tornamos a flecha certeira, por mais que os obstáculos estiquem nosso arco.
Quando acontece o erro, questione-se: “aonde esse erro vai me levar”?
Algumas derrotas podem ser fundamentais. Talvez não fosse a hora, talvez não fosse o rumo certo. Precisamos aprender a ler as entrelinhas dos “acasos”, pois tudo acontece porque tem que acontecer. Nós atraímos, inconscientemente, tudo o que nos fará aprender, amadurecer, crescer. Se pensarmos no que temos atraído, talvez possamos aprender com menos dor.

Chico Xavier já dizia: “Não podemos voltar atrás e fazer um novo começo, mas podemos começar agora e construir um outro fim”. A frustração por não termos conseguido atingir um alvo é natural, mas se nos limitamos a ver somente o que erramos corremos o risco de não valorizar todos os acertos, que certamente existiram. Vamos treinar a nossa sensibilidade para identificar, no meio dos resultados negativos, aquilo que existe de positivo e, a partir daí, recomeçar.

Temos que aprender a nos valorizar. A ajuda dos outros deve ser encarada, quando necessária, como uma muleta temporária, não como impossibilidade permanente de caminharmos com os nossos próprios pés. Quem quer se sentir emocionalmente cadeirante? Temos que aprender a enfrentar os desafios, valorizando os nossos próprios recursos, aceitando os medos e superando-os, sem fugir de derrotas, sem se cobrar perfeição, sem julgamentos limitantes. 
Precisamos diminuir aquela sensação de solidão e de abandono
Elas muitas vezes acompanham os distúrbios e as doenças que vivemos. Precisamos ter um olhar menos crítico, mais “bondoso” com o que consideramos nossos inimigos interiores, nossos medos, nossas dificuldades, com o que pensamos serem os nossos “defeitos”. Todos esses aspectos da personalidade, se aceitos e valorizados, acabam por constituir a nossa unicidade, aquilo que possuímos de mais precioso.

Assim como os monstros da nossa infância desapareciam com o nascer do sol, os nossos medos desaparecem quando acendemos a luz de uma nova aceitação e confiança.
Herói não é quem faz coisas extraordinárias, mas aquele que consegue viver a vida com paixão e prazer. Amar a vida, mesmo quando parece que as coisas não dão certo, renovar a confiança.

Quando se vive como vítima, não se consegue atingir a meta prefixada, não se aproveitam todos os recursos de que se dispõe: delega-se a solução do problema a quem está ao seu lado, transmite-se ansiedade e insegurança a todos que estão ao seu redor.

Temos que aprender a criar formas pensamento de prazer, de otimismo, que serão os alicerces que nos sustentarão em momentos mais difíceis. Sempre que pensamentos pessimistas quiserem pintar a sua vida com cores escuras, pegue em sua alma uma paleta cheia de cores e dê à tela dos seus pensamentos o visual que você quer para a sua vida. 

Leonard F. Verea é médico psiquiatra formado pela Faculdade de Medicina e Cirurgia de Milão, Itália. Especializado em Medicina Psicossomática e Hipnose Clínica; é membro de diversas entidades nacionais e internacionais. Contatos: verea@verea.com.br  www.verea.com.br